RMNR: o respeito ao trânsito em julgado anterior a decisão do STF

 

  1. Jurisprudência recente proferida pelo Colendo TST, Ministro Presidente do TST Lelio Bentes Corrêa, PROCESSO Nº TST-TutCautAnt – 1000688-80.2024.5.00.0000, datada de 24 de julho de 2024:

 

PROCESSO Nº TST-TutCautAnt – 1000688-80.2024.5.00.0000

REQUERENTE : PETROLEO BRASILEIRO S A PETROBRAS

 

D E C I S Ã O

Trata-se de Tutela Cautelar antecedente, preparatória para o ajuizamento de Ação Rescisória perante esta Corte superior, com a finalidade de rescindir acórdão prolatado pela colenda Subseção I Especializada em Dissídios Individuais do TST, nos autos de Reclamação Trabalhista, com trânsito em julgado operado em 5/5/2015 (Processo n.º 0000159-05.2011.5.11.0008).

 

Por meio da r. decisão impugnada, a SBDI-1 do TST deu provimento ao Recurso de Embargos interposto pela parte obreira para “estabelecer que o Complemento da RMNR deve resultar da diferença entre a RMNR e o salário básico mais as vantagens pessoais, excetuados os adicionais, e assim reconhecer devidas as diferenças de Complemento da RMNR, vencidas e vincendas, a serem apuradas em execução”.

 

Pretende a ora requerente sobrestar o curso da execução trabalhista, “bem como impedir que o valor bloqueado via Bacenjud (Id ca25649) seja liberado ao autor”.

 

Quanto ao cumprimento do prazo decadencial para o ajuizamento da Ação Rescisória, alega a parte requerente (grifos aditados):

 

O prazo decadencial para ajuizamento de rescisória (e que ampara igualmente o ajuizamento desta tutela antecedente, que lhe é acessória) que está previsto no artigo 525, §15 do CPC/2015, cuja redação é a seguinte: “Se a decisão referida no § 12 for proferida após o trânsito em julgado da decisão exequenda, caberá ação rescisória, cujo prazo será contado do trânsito em julgado da decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal”.

 

O trânsito em julgado da decisão paradigma do c. STF no RE n. 1.251.927/DF se deu em 04/03/2024, termo a quo do início do prazo decadencial para a rescisória (e para a respectiva tutela antecedente). Ademais, o Tema 100 de Repercussão Geral – RG do Supremo Tribunal Federal também evidencia que pouco importa que a decisão do STF tenha sido proferida posteriormente à formação da coisa julgada no processo individual. (…).

 

Conforme alega, o acórdão que será objeto da futura Ação Rescisória encontra-se em “manifesto confronto com o acórdão proferido com eficácia vinculante pelo Supremo Tribunal Federal no RE n. 1.251.927/DF, no qual ficou decidido que é inconstitucional o aumento da remuneração dos empregados em decorrência da exclusão dos adicionais decorrentes de condições especiais de trabalho da fórmula de cálculo do ‘Complemento da RMNR’, discriminada na Cláusula 36ª, parágrafo 3º, do Acordo Coletivo de Trabalho de 2007 da categoria (cujo conteúdo se repete nos instrumentos coletivos posteriores com igual teor)”.

 

Argumenta que “[o] v. acórdão supratranscrito violou autonomia da vontade coletiva estampada na cláusula normativa firmada entre as partes de modo a criar direito não existente, sob o argumento de que a cláusula coletiva feriria o princípio da isonomia”.

 

Além de sustentar o descumprimento da decisão vinculante proferida pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do Recurso Extraordinário n.º 1.251.927/DF, com Repercussão Geral, a requerente aponta violação do artigo 7º, XXVI, da Constituição da República e da Súmula Vinculante n.º 37 do STF. De igual sorte, alega desrespeito ao quanto decidido pela Corte suprema nos Temas 152 e 1046 da tabela de Repercussão Geral.

 

Enfatiza que “a Reclamação Trabalhista em epígrafe já se encontra em fase de execução e nela restou determinado o prosseguimento da execução, busca-se impedir que o valor bloqueado via Bacenjud (Idca25649) seja liberado ao  autor. Isso posto, se requer o acolhimento da presente tutela antecedente, de caráter liminar, para concessão de efeito suspensivo da execução até o julgamento definitivo da futura rescisória (…)”.

 

No que toca ao atendimento dos requisitos para a concessão de tutela cautelar, consigna que “[o] fumus boni juris decorre diretamente da manifesta violação ao art. 7º, XXVI, da CRFB/88, dado o desprezo da decisão de primeiro grau e do acórdão que se pretenderá rescindir ao princípio da prevalência do negociado sobre o legislado, à efetiva negociação coletiva ocorrida e aos termos do Acordo Coletivo de Trabalho elaborado pelas partes”.

 

Pontua que “[o] periculum in mora reside na iminência (sic) aplicação de multa diária em decorrência da determinação da obrigação de fazer e prosseguimento da execução, o que causará graves prejuízos financeiros de difícil reparação à executada”.

 

Pondera, ainda, “por dever de ofício, que a sustação da execução da ação trabalhista originária em nada afetará a futura satisfação da prestação jurisdicional, caso não venha a ser acolhida a futura rescisória, considerando a solidez da PETROBRAS, a efetiva solvabilidade de seus ativos patrimoniais bem como o fato de já haver valores bloqueados”.

 

Por fim, requer “seja concedida liminar para sustar imediatamente a execução do feito original até julgamento definitivo da futura ação rescisória, impedindo qualquer aplicação de multas”.

 

O presente feito foi encaminhado à Presidência desta Corte superior, nos termos do artigo 41, XXX, do Regimento Interno do TST.

 

Ao exame.

Consoante dispõe o artigo 300 do Código de Processo Civil, “a tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo”.

 

A Súmula n.º 405 do TST, a seu turno, consagra o seguinte entendimento:

 

AÇÃO RESCISÓRIA. TUTELA PROVISÓRIA. Em face do que dispõem a MP 1.984-22/2000 e o art. 969 do CPC de 2015, é cabível o pedido de tutela provisória formulado na petição inicial de ação rescisória ou na fase recursal, visando a suspender a execução da decisão rescindenda”.

 

No caso em tela, o acórdão sobre o qual recairá o pleito de corte rescisório, proferido pela colenda Subseção I Especializada em Dissídios Individuais do TST em 5/6/2014, ostenta o seguinte teor, na fração de interesse (pp. 68/75; id. c63ddf7; os destaques são do original):

 

O debate cinge-se em apreciar acerca de sistema criado pela empresa Petrobras, denominado RMNR – Remuneração Mínima por Nível e Regime. Inicialmente, declino os fundamentos pelos quais vinha me manifestando pela validade da norma coletiva:

…………………..

No entanto, a c. SDI, pela maioria, posicionou-se em sentido diverso, ao concluir que a interpretação a ser conferida à norma coletiva, sob pena de se conferir tratamento discriminatório aos integrantes da categoria, é a de que não se devem incluir na composição da RMNR os adicionais previstos em lei.

 

Eis os fundamentos do voto vencedor, em decisão da lavra do Exmo. Ministro Augusto César de Carvalho (E-RR-848-40-2011-5-11-0011), pendente de julgamento neste momento, mas que peço vênia para transcrever:

 

“São três as razões pelas quais entendo deva prevalecer a compreensão que têm da norma os trabalhadores insurgentes, no caso, o trabalhador insurgente: a) a exegese literal da norma, quando conduz a uma ilicitude, não exaure a atividade hermenêutica; b) o dispositivo de norma coletiva não comporta interpretação que implique a ineficácia de norma jurídica superior, seja a lei ou a Constituição; c) o postulado da isonomia não se exaure no tratamento igual perante a lei (igualdade formal), mas exige, para concretizar-se inteiramente, que sejam tratados desigualmente aqueles que se encontram, frente à ordem jurídica, em condições de manifesta desigualdade.

 

obre a primeira dessas razões – a exegese literal da norma não exaurir atividade exegética -, inicio pela reprodução da cláusula sob exame.

 

Na parte que interessa, diz a cláusula que “será pago sob o título de complemento de RMNR as diferenças resultantes entre a Remuneração Mínima por Nível e Regime de que trata o caput e o salário básico (SB), a vantagem pessoal – Acordo Coletivo de Trabalho (VP-ACT) e a vantagem pessoal-subsidiária (VP-SUB), sem prejuízo de eventuais outras parcelas pagas, podendo resultar em valor superior a RMNR”.

 

O parágrafo seguinte prevê que igual procedimento “aplica-se aos empregados que laboram em regime e/ou condições especiais de trabalho em relação às vantagens devidas em decorrência destes”.

 

Em rigor, decompôs-se o salário em três níveis: parcelas que expressamente integravam a quantia a ser complementada até se alcançar a RMNR (salário-base, VPACT e VP-SUB). Segundo nível: vantagens que seriam pagas em razão de regime ou condição especial de trabalho e que seriam igualmente complementadas. Terceiro: outras parcelas que, sendo pagas, fariam resultar um valor superior à RMNR.

 

A questão reside em saber se os adicionais estão entre as parcelas que não compõem o valor da RMNR e cujo valor pode inclusive extrapolá-la (vale frisar que essas parcelas existem, como se extrai da cláusula normativa ora analisada, quer dizer, essas parcelas que podem extrapolar a RMNR) ou se estão os adicionais entre as vantagens aplicadas a empregados que laboram em condição ou regime especial, incluindo-se na composição da RMNR.

 

Neste tópico, e em detrimento da linha de argumentação proposta por vários trabalhadores inconformados, admito a interpretação que levasse à conclusão de que a intenção teria sido a inclusão desses adicionais.

 

E, na sequência, sustento o seguinte: dir-se-ia que, embora não se inclua entre as condições especificamente previstas na lei regente do trabalho petroquímico (Lei n.º 5.811/72), a condição de trabalho em área de risco é decerto uma condição especial e parece-me razoável compreender, ademais, que a vontade coletiva quis eventualmente referir-se aos adicionais quando previu que as “vantagens” relacionadas com o labor em condições especiais estariam entre as parcelas que seriam complementadas até alcançar-se a RMNR.

 

Parto do pressuposto de que essa é uma interpretação possível. Essa interpretação estrita da norma coletiva não deve, porém, preponderar pela singela razão de negar eficácia, por sinuosa via, a todos os direitos oriundos de condições especiais de trabalho que sejam assegurados em norma de hierarquia superior.

 

A preferência pela interpretação estrita, nas hipóteses de cláusulas benéficas (ressalto que a RMNR é, por definição, uma cláusula benéfica, porque terá significado um aumento, embora um aumento que desiguale os desiguais), não pode avançar a ponto de legitimar uma conduta ilícita, sendo tal o seu limite de contenção.

 

Enfrento, então, a segunda razão pela qual não pode prevalecer a interpretação preconizada pela empresa.

 

É que, sendo embora de bom augúrio que todos os empregados recebam igual tratamento salarial quando se ativam em situações idênticas, a lei impõe ônus financeiro irrelevável ao empregador que submete o empregado a condições adversas de labor, que afetem o tempo de descanso, alimentação ou sono, o lazer e o convívio social ou familiar que dignificam o trabalhador como pessoa humana.

 

Ao empregador é vedado, portanto, instituir (ou coparticipar da instituição de) uma remuneração que incluiria, por antecipação, toda e qualquer parcela compensatória, por exemplo, de trabalho em hora extra ou noturna, de sobreaviso ou de descanso, ou remuneração que absorvesse preventivamente os adicionais devidos em razão do labor em área ou condições de risco à saúde ou à integridade física.

 

Ilustrativamente, a interpretação sugerida pela empresa a liberará da obrigação de acrescer à remuneração de seu empregado a quantia correspondente ao adicional de hora extra mesmo quando lhe impuser sobrejornada.

 

Não estou dizendo que a Petrobras está fazendo isso, mas a interpretação que está sendo sugerida leva a essa conclusão. Se o empregado prestar hora extra, esta vai estar dentro do guarda-chuva, estará compreendida na RMNR, ele receberá só a diferença, a complementação, até chegar ao valor.

 

Para que isso aconteça, basta que ajuste o complemento da RMNR ao valor menor, que passaria, assim, a pagar a esse título, dado que menor seria a diferença entre a RMNR e a soma das parcelas salariais, agora acrescidas do adicional de hora extra. O mesmo se daria com qualquer outro adicional que se tornasse devido após a instituição da RMNR.

 

A terceira razão, enfim, e assim concluo, para que se entenda insubsistente a interpretação pretendida pela empresa é, também, a mais eloquente delas.

 

O art. 7.º, XXIII, da Constituição, garante aos trabalhadores o adicional de remuneração para as atividades perigosas, insalubres, noturnas e em jornada extraordinária, na forma da lei – art. 7.º, na verdade. Trata-se, no âmbito dos direitos fundamentais, de situação diferenciada de trabalho para a qual se impõe tratamento distinto, ou seja, veda-se a mesma medida de proteção.

 

A régua é constitucional e, por sê-lo, não se deixa afetar pelo senso diferente de simetria, que anima porventura ao empregador, na exegese que defende para a cláusula normativa.

 

A propósito, resulta incontroverso que os autos cuidam de empregado que, nos termos da lei, prestaria trabalho em condições que lhe asseguraria o direito ao adicional de periculosidade, adicional noturno e adicional de horas de repouso e alimentação.

 

Não se trata da situação a que se reporta o VP-ACT – aquele adicional de periculosidade que era pago indistintamente e que foi incorporado a título de VP-ACT, não se trata dessa situação, não é isso que se está incorporando -, rubrica destinada a prorrogar o recebimento dos adicionais de periculosidade, insalubridade e horas extras pelos empregados que, mesmo quando não exerciam atividade nessas condições, recebiam-no até 1997.

 

Estando dissociada do trabalho em situação de perigo, insalubre ou em jornada extraordinária, a VP-ACT pode ser absorvida pela RMNR, pois a essa vantagem não se aplicam as premissas fundantes desta decisão.

 

O que importa, neste processo, é a impossibilidade de os adicionais devidos – por motivo previsto em lei ou na Constituição – serem absorvidos pela RMNR.

 

A RMNR não pode igualar onde a Constituição exige desigualdade. E essa constatação, que é bastante per se, ganha agravamento quando se infere da própria cláusula normativa que a observância da remuneração mínima ocorre “sem prejuízo de eventuais outras parcelas pagas, podendo resultar em valor superior a RMNR”.

 

A isonomia, que se mostra assim deliberadamente parcial, ressalva apenas os elementos de discriminação que a tabela de níveis remuneratórios da empresa entende razoáveis, sem qualquer parâmetro na lei. É como dizer: há parcelas, criadas no âmbito da empresa, que não seriam absorvidas pela RMNR, enquanto os adicionais previstos em norma estatal o seriam.

 

O discrímen legal ou mesmo constitucional é pretensiosamente desconsiderado pelo modelo exegético proposto pela defesa, em proveito da forma discriminatória de remunerar supostamente criada pela norma coletiva. Como visto, não o foi, nem poderia ter sido.

 

O art. 7.º, XXVI, da Constituição não autoriza a negociação coletiva quando ela estabelece regra de isonomia que despreza elementos de discriminação exigidos por lei e pela norma constitucional.

 

Assim, por disciplina judiciária, curvo-me ao entendimento dominante desta c. 6ª Turma, pedindo venia apenas para ressalvar o meu entendimento, trazendo a lume precedente, já publicado, na mesma linha do leading case acima citado:

………………………………..

Com esses fundamentos, dou provimento ao recurso de Embargos, com minha ressalva, para estabelecer que o Complemento da RMNR deve resultar da diferença entre a RMNR e o salário básico mais as vantagens pessoais, excetuados os adicionais, e assim reconhecer devidas as diferenças de Complemento da RMNR, vencidas e vincendas, conforme pedido na exordial.

 

Conforme se extrai da certidão juntada aos autos do feito principal (Processo n.º0000159-05.2011.5.11.0008), aludida decisão transitou em julgado em 5/5/2015.

 

O exame das peças colacionadas pela requerente, bem como daquelas integrantes do processo principal permite constatar que o MM. Juízo da execução, mediante decisão proferida em 17/7/2024, entendeu ser devido o prosseguimento da execução, nos seguintes termos:

 

Desse modo, da análise da decisão do STF no Agravo Regimental no Recurso Extraordinário 1.251.927/RN, a qual já transitou em julgado, pode-se concluir pela seguinte modulação dos efeitos jurídicos da decisão do STF: (I) prosseguimento da execução do título executivo formado neste processo – ainda que o acórdão já transitado em julgado tenha adotado entendimento diverso do que do que foi decidido posteriormente pelo STF, o qual somente deixa de prevalecer pelo corte rescisório e (II) cessação dos efeitos futuros do pagamento de diferença de “complemento de RMNR” a partir da data da decisão do STF.

Assim, ante as considerações delineadas, entendo que a execução deve prosseguir nos termos do título executivo.

 

Diante desse contexto, não se vislumbra, todavia, em sede de juízo precário de cognição, a plausibilidade jurídica da pretensão deduzida na presente Tutela Cautelar.

 

Não se desconhece que, em 1/3/2024, transitou em julgado o acórdão prolatado pela 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal, nos autos do Recurso Extraordinário nº 1.251.927, com Repercussão Geral reconhecida. Por meio da aludida decisão, com efeito vinculante, ratificou-se decisão monocrática da lavra do Exmo. Ministro Alexandre de Moraes, que, por não vislumbrar qualquer inconstitucionalidade, nos termos do acordo coletivo livremente firmado entre as empresas recorrentes (Petróleo Brasileiro S.A. – Petrobras e Petrobras Transporte S.A. – Transpetro) e os sindicatos dos petroleiros, dera provimento aos Recursos Extraordinários interpostos pelas empresas para restabelecer a improcedência do pedido de diferenças do complemento de RMNR e reflexos.

 

Decidiu a 1ª Turma do STF, em síntese, que os critérios para o cálculo do valor do “complemento da RMNR” são isonômicos, razoáveis e proporcionais, não tendo havido redução ou supressão de qualquer direito trabalhista. Validou-se, assim, a inclusão dos adicionais de origem constitucional e legal, bem como dos adicionais criados por normas coletivas, regulamento empresarial ou descritos nos contratos individuais de trabalho na base de cálculo para apuração do complemento da RMNR.

 

Não se olvida, ainda, que, em sessão de julgamento ocorrida em 23/5/2024, a SBDI-I do TST decidiu, por unanimidade, acolher a proposta de instauração do incidente de superação do entendimento firmado no Tema nº 13 da Tabela de Recursos de Revista Repetitivos, em sentido contrário à superveniente decisão vinculante do STF no RE n.º 1.251.927.

 

A despeito de tais circunstâncias, é forçoso reconhecer que, no caso sob exame, o acórdão prolatado pela SBDI-I, apontado como objeto do futuro pedido de corte rescisório, transitou em julgado em 5/5/2015, sob a égide do Código de Processo Civil de 1973. Assim, de há muito se encontra esgotado o prazo decadencial de dois anos previsto no artigo 495 do CPC de 1973, no sentido de que “[o] direito de propor ação rescisória se extingue em 2 (dois) anos, contados do trânsito em julgado da decisão”.

 

Na mesma linha segue a diretriz consagrada no item I da Súmula n.º 100 do TST, de seguinte teor:

 

AÇÃO RESCISÓRIA. DECADÊNCIA.

I – O prazo de decadência, na ação rescisória, conta-se do dia imediatamente subsequente ao trânsito em julgado da última decisão proferida na causa, seja de mérito ou não. (…).

 

Ademais, a pretensão deduzida pela requerente, com espeque na norma do artigo 525, §15, do CPC de 2015, no sentido de fixar, como termo inicial do prazo decadencial para o ajuizamento da Ação Rescisória, a data do trânsito em julgado do acórdão prolatado pela 1ª Turma do STF nos autos do RE n.º 1.251.927, em 4/3/2024, não encontra guarida na jurisprudência pacífica da Subseção II Especializada em Dissídios Individuais desta Corte superior.

 

Com efeito, é assente na jurisprudência da SBDI-II do TST o entendimento de que, nos termos do artigo 1.057 do CPC de 2015, a norma do artigo 525, § 15, do mesmo diploma legal aplica-se tão somente às decisões transitadas em julgado após a sua entrada em vigor. A contrario sensu, operando-se o trânsito em julgado da decisão rescindenda antes da vigência do CPC de 2015, incide a regra do artigo 495 do CPC de 1973.

 

Mencionem-se, nesse sentido, os seguintes julgados recentes da SBDI-II do TST, tomados a título exemplificativo (destacamos):

 

“RECURSO ORDINÁRIO DA AUTORA. AÇÃO RESCISÓRIA. DECISÃO TRANSITADA EM JULGADO NA VIGÊNCIA DO CPC DE 1973. PRETENSÃO RESCISÓRIA CALCADA NO ART. 525, § 15, DO CPC DE 2015. INAPLICABILIDADE DO DISPOSITIVO LEGAL. INCIDÊNCIA DO ARTIGO 1.057 DO CPC DE 2015. CAUSAS DE RESCINDIBILIDADE DO CPC DE 1973. PROPOSITURA DA AÇÃO DESCONSTITUTIVA APÓS O BIÊNIO LEGAL. DIREITO DE PROPOR A AÇÃO FULMINADO PELA DECADÊNCIA. SÚMULA 100, I, DO TST. 1. Cuida-se de recurso ordinário em ação rescisória, proposta com fundamento no art. 525, § 15, do CPC de 2015, por meio da qual a Autora pretende a desconstituição do acordão proferido pelo Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região, no julgamento do recurso ordinário, nos autos da reclamação trabalhista matriz, baseada na circunstância de que a decisão passada em julgado está em desconformidade com a tese firmada no julgamento do RE 958.252/MG e da ADPF n° 324/DF (Tema 725 da tabela de Repercussão Geral do Supremo Tribunal Federal). A Corte Regional negou provimento ao agravo interno interposto pela Autora, confirmando, assim, a decisão unipessoal do Desembargador relator no sentido de pronunciar a decadência e julgar extinta a presente ação rescisória, na forma do art. 487, inciso II, do CPC de 2015. 2. O atual Código de Processo Civil, nos artigos 525, § 15, e 535, § 8º, prevê expressamente o cabimento de ação rescisória quando a decisão declaratória de inconstitucionalidade de lei for proferida pelo Supremo Tribunal Federal após o trânsito em julgado da decisão exequenda, cujo prazo decadencial começará a contar do trânsito em julgado da decisão emanada da Corte Constitucional. Porém, o artigo 1.057 do mesmo diploma legal restringe a aplicabilidade dessas normas às decisões transitadas em julgado após a sua entrada em vigor. 3. In casu, o trânsito em julgado da decisão rescindenda ocorreu antes da entrada em vigor do novo Código, situação que atrai a incidência das disposições do CPC de 1973. Assim, não há espaço para aplicação do disposto no § 15 do art. 525 do CPC de 2015 na situação vertente e, por consectário, do termo a quo do prazo decadencial para ajuizamento de ação rescisória previsto no dispositivo legal em foco. 4. Ressalta-se, além disso, que o STF, quando do julgamento do RE 730.462/SP, fixou a Tese 733 da sistemática de Repercussão Geral nos seguintes termos: “A decisão do Supremo Tribunal Federal declarando a constitucionalidade ou a inconstitucionalidade de preceito normativo não produz a automática reforma ou rescisão das decisões anteriores que tenham adotado entendimento diferente. Para que tal ocorra, será indispensável a interposição de recurso próprio ou, se for o caso, a propositura de ação rescisória própria, nos termos do art. 485 do CPC, observado o respectivo prazo decadencial (CPC, art. 495)”. Dessa forma, mesmo que examinada a controvérsia sob a perspectiva das hipóteses de rescindibilidade previstas no CPC de 1973 (art. 485), a contagem do respectivo prazo decadencial deve observar a regra geral prevista no art. 495 do diploma legal de 1973. 5. Com efeito, o prazo para o ajuizamento da ação rescisória é de 2 (dois) anos, a contar do trânsito em julgado da decisão que se pretende rescindir (artigo 495 do CPC de 1973). Nesse exato sentido a diretriz sedimentada no item I da Súmula 100 do TST, segundo a qual, na ação rescisória, o prazo decadencial é contado do dia subsequente ao trânsito em julgado da última decisão proferida na causa, ainda que não seja de mérito. 6. Na hipótese, a decisão indicada como rescindenda transitou em julgado em 14/8/2015, contudo a presente ação rescisória foi proposta somente em 6/6/2020, muito tempo depois de escoado o biênio legal. Definitivamente, sob a perspectiva das causas de rescindibilidade listadas no CPC de 1973, operou-se a decadência, pois exaurido o prazo de 2 anos previsto no artigo 495 do referido diploma. Recurso ordinário conhecido e não provido. (…).”(ROT-10403-24.2020.5.03.0000, Subseção II Especializada em Dissídios Individuais, Relator Ministro Douglas Alencar Rodrigues, DEJT 24/05/2024).

 

 

“RECURSO ORDINÁRIO EM AÇÃO RESCISÓRIA. DECISÃO RESCINDENDA TRANSITADA EM JULGADO SOB A VIGÊNCIA DO CPC/1973. PRETENSÃO RESCISÓRIA CALCADA NOS ARTS. 525, § 12 E 535, § 8º DO CPC/2015. ADI 5348. INAPLICABILIDADE DO CPC/2015. INCIDÊNCIA DO ART. 495 DO CPC/1973. DECADÊNCIA CONFIGURADA. Trata-se de ação rescisória calcada nos arts. 525, § 12º e 535, § 8º do CPC/2015, através da qual a autora pretende desconstituir sentença homologatória de cálculos, em razão da inconstitucionalidade do art. 1º-F da Lei n. 9.494/1997 declarada pelo Supremo Tribunal Federal na ADI 5348. Com efeito, os arts. 525, § 12º e 535, § 8º do CPC/2015 estabelecem a contagem do prazo decadencial para ajuizamento da ação rescisória a partir do trânsito em julgado da decisão proferida pelo STF em sede de controle de constitucionalidade concentrado ou difuso. Na hipótese, a sentença homologatória dos cálculos foi prolatada em 11/5/2015, com trânsito em julgado em 29/7/2015, antes da entrada em vigor do CPC de 2015 ocorrida em 18/3/2016. Desse modo, a pretensão rescisória encontra-se submetida às regras do CPC/1973, conforme disciplina o art. 1.057 do CPC/2015, segundo o qual “o disposto no art. 525, §§ 14 e 15, e no art. 535, §§ 7º e 8º, aplica-se às decisões transitadas em julgado após a entrada em vigor deste Código, e, às decisões transitadas em julgado anteriormente, aplica-se o disposto no art. 475-L, § 1º, e no art. 741, parágrafo único, da Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973”. Do exposto, transitada em julgado a decisão rescindenda em 29/7/2015 e ajuizada a ação rescisória somente em 2/9/2021, conclui-se que acertada a pronúncia da decadência pelo Colegiado Regional, uma vez que ultrapassado o biênio previsto no art. 495 do CPC/1973. Recurso ordinário conhecido e desprovido”. (ROT-21952-67.2021.5.04.0000, Subseção II Especializada em Dissídios Individuais, Relatora Ministra Liana Chaib, DEJT 10/05/2024).

 

 

“AGRAVO EM RECURSO ORDINÁRIO EM AÇÃO RESCISÓRIA. DECADÊNCIA. DECISÃO RESCINDENDA COM TRÂNSITO EM JULGADO SOB A ÉGIDE DO CPC/1973. APLICAÇÃO DO PRAZO DO ART. 535, § 8º, DO CPC/2015. IMPOSSIBILIDADE. 1. Trata-se de pretensão rescisória ajuizada em 14/10/2021, com o intuito de desconstituir sentença homologatória de cálculos prolatada em 2008 e que teve seu trânsito em julgado consolidado ainda na vigência do CPC/1973. 2. Nessa circunstância, não há espaço para a aplicação retroativa da contagem do prazo decadencial prevista no art. 525, § 15, do CPC/2015, afigurando-se inviável sua incidência sobre decisões judiciais transitadas em julgado na vigência do Código Processual anterior, por expressa vedação do art. 1.057 do CPC/2015. 3. Disso se conclui que a existência de decisão superveniente proferida pelo Supremo Tribunal Federal em sede de controle de constitucionalidade (no caso concreto, proferida no julgamento da ADI nº 5348, transitada em julgado em 7/12/2019) não autoriza o recomeço da contagem do prazo decadencial iniciado sob o regramento do CPC/1973. 4. Irretocável a decisão monocrática que manteve a pronúncia da decadência. Agravo conhecido e desprovido”. (Ag-ROT-22247-07.2021.5.04.0000, Subseção II Especializada em Dissídios Individuais, Relatora Ministra Morgana de Almeida Richa, DEJT 11/12/2023).

 

 

“RECURSO ORDINÁRIO. AÇÃO RESCISÓRIA AJUIZADA SOB A ÉGIDE DO CPC DE 2015. COISA JULGADA FORMADA SOB A VIGÊNCIA DO CPC DE 1973. CRITÉRIO DE ATUALIZAÇÃO DOS DÉBITOS TRABALHISTAS. DECLARAÇÃO SUPERVENIENTE DE INCONSTITUCIONALIDADE DO ART. 1.º-F DA LEI N.º 9.494/97. ADI N.º 5.348. INAPLICABILIDADE DO ART. 535, § 8.º, DO CPC DE 2015 NA ESPÉCIE. INCIDÊNCIA DO ART. 1.057 DO CPC/2015. DECADÊNCIA DA PRETENSÃO DESCONSTITUTIVA. PRECEDENTES. 1. Cuida-se de ação rescisória ajuizada com fundamento nos arts. 535, § 8.º, e 966, V, do CPC de 2015, para desconstituir sentença homologatória de cálculos de liquidação em que se__ declaração superveniente de inconstitucionalidade do art. 1.º-F da Lei n.º 9.494/97 mediante a ADI n.º 5 . 348. 2. Segundo se depreende dos autos, a sentença rescindenda transitou em julgado em 14/3/2016, ao passo que a ação rescisória foi ajuizada em 21/9/2021. 3. É bem verdade que o acórdão do STF proferido na ADI n.º 5.348 transitou em julgado em 7/12/2019, fato que, mediante aplicação analógica do art. 535, § 8.º, do CPC de 2015, poderia, talvez, evidenciar a observância do prazo decadencial na espécie. Ocorre que, como já destacado anteriormente, a coisa julgada apresentada como objeto da pretensão desconstitutiva nestes autos cimentou-se em 14/3/2016, isto é, ainda sob a vigência do CPC de 1973, e nesse contexto é inafastável a incidência da disposição contida no art. 1.057 do CPC/2015, que veda expressamente a aplicação do art. 535, § 8.º, nessa hipótese. 4. Corolário desse raciocínio é a constatação da decadência da ação rescisória, na esteira dos precedentes desta SBDI-2, em razão da extrapolação do prazo previsto pelo art. 495 do CPC de 1973, aplicável à espécie por se tratar de coisa julgada cimentada sob a égide do antigo codex, o que impõe a manutenção do acórdão regional. 5. Recurso Ordinário conhecido e não provido”. (ROT-22079-05.2021.5.04.0000, Subseção II Especializada em Dissídios Individuais, Relator Ministro Luiz Jose Dezena da Silva, DEJT 17/11/2023).

 

Num tal contexto, não resulta evidenciada, no caso, a possibilidade de êxito de eventual Ação Rescisória a ser ajuizada perante esta Corte superior, uma vez exaurido o prazo decadencial de dois anos para sua propositura, nos termos do artigo 495 do CPC de 1973, na trilha do entendimento jurisprudencial consolidado da SBDI-II do TST.

 

Como corolário, afastada a probabilidade de desconstituição do título exequendo pela via da Ação Rescisória, não se divisa, de igual sorte, o alegado perigo na demora em decorrência do regular prosseguimento da execução, conforme determinado pela Corte regional no julgamento do Agravo de Petição.

 

Ante o exposto, indefiro o presente pedido de tutela cautelar de urgência.

Dê-se ciência do inteiro teor da presente decisão ao MM. Juízo da 8ª Vara do Trabalho de Manaus-AM.

Publique-se.

Brasília, 24 de julho de 2024.

LELIO BENTES CORRÊA

Ministro Presidente do TST

Um abraço, Carmela Grune

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